domingo, 5 de outubro de 2014

LEITURA DIGESTIVA



domingo, outubro 05, 2014

Em quem voto e por quê - FERNANDO HENRIQUE CARDOSO



O ESTADO DE S.PAULO - 05/10

Poucas vezes o refrão de estarmos numa encruzilhada terá sido tão verdadeiro. Neste domingo os eleitores carregam para a votação o peso de uma responsabilidade histórica. E o mais grave é que, dadas as condições do debate eleitoral e as formas prevalecentes de manipulação da opinião pública, boa parte do eleitorado nem atina qual seja a bifurcação diante da qual o País está.

Numa das mais mistificadoras campanhas dos últimos tempos, a máquina publicitária e corruptora do PT e aliados espalhou boatos de que Aécio Neves acabaria com os programas sociais (em grande parte criados pelo próprio PSDB!) e Marina Silva seria a expressão dos interesses dos banqueiros, tendo nas mãos, com a independência do Banco Central, a bomba atômica para devastar os interesses populares. Por mais ridículas, falsas e primárias que sejam as imagens criadas (também eram simplificadoras as imagens do regime nazista ou do stalinista para definir os "inimigos"), elas fizeram estragos no campo opositor.

A guerra de acusações descabidas escondeu o tempo todo o que a candidata à reeleição deixou claro nos últimos dias: suas distorções ideológicas. Fugindo aos scripts dos marqueteiros, que a pintam como uma risonha e bonachona mãe de família, e do PAC, a presidenta vem reafirmando arrogantemente que tudo o que fez foi certo; se algo deu errado, foi, como diria Leonel Brizola, por conta das "perdas internacionais". Mais ainda, disse com convicção espantosa ser melhor dialogar com os degoladores de cabeças inocentes do que fazer-lhes a guerra, coisa que só os "bárbaros" ocidentais pensam ser necessária.

E o que é isso: socialismo? Populismo? Não, capitalismo de Estado, sob controle de um partido (ou do chefe do Estado). Um governo regulamentador, soberbo diante da sociedade, descrente do papel da opinião pública ("não é função da imprensa investigar", outra pérola dita recentemente por Dilma), com apetite para cooptar o que seja necessário, desde empresários "campeões nacionais" até partidos sedentos de um lugar no coração do governo. Algo parecido com o que o lema do velho PRI mexicano expressava: fora do orçamento, não há salvação; nem para as empresas, nem para os partidos, nem para os sindicatos, para ninguém. Crony capitalism, dizem os americanos. Capitalismo para a companheirada, diríamos nós.

E sempre com certo ar de grandeza, herdado do antecessor: nunca antes como agora. Para provar os acertos, vale tudo: fazer citações sem respeito ao contexto, escamotear as contas públicas ou até mesmo, para se justificar, dizer: "Nunca ninguém puniu tanto os corruptos como este governo!". Como se as instituições de Estado (Polícia Federal, Ministério Público, tribunais, etc.) fossem mera extensão dos governantes.

Criou-se um clima de ilusão e embuste usando uma retórica baseada no exagero e na propaganda. Será isso democracia? Estamos, pouco a pouco, apesar de mantidas as formas democráticas, afastando-nos de seu real significado. Como em alguns outros países da América Latina. Com jeitinho brasileiro, mas com iguais consequências perversas. O modo de governar (democraticamente ou não) é tão importante para mostrar as diferenças entre os partidos quanto as divergências de orientação nas políticas econômicas ou sociais.

Por mais que a propaganda petista mistifique, as políticas sociais têm o rumo definido desde a Constituição de 1988. Executadas com maior ou menor perícia por parte de quem governa, com maior ou menor disponibilidade de recursos, o caminho dessas políticas está traçado: mais e melhor educação, mais e melhor saúde, mais e melhor amparo a quem necessita (bolsas, aposentadorias, etc.). Já a política econômica perdeu o rumo e destrói pouco a pouco as bases institucionais que permitiram consolidar a estabilidade e favorecer o crescimento da economia.

No conjunto de sua obra, o governo atual rompeu o equilíbrio alcançado entre Estado, mercado e sociedade e dá passos na direção de um modelo à Ernesto Geisel. Tal modelo é incompatível com a democracia e com a economia moderna. Não poderão sobreviver os três ao mesmo tempo.

É esse o fantasma que nos ronda. Reeleita a candidata, a assombração vira ameaça real. Ameaça à economia e ao regime político, pelo menos quanto ao modo de entender o que seja democracia. Não é preciso que nos ensinem que democracia requer inclusão social e alargamento da participação política. Essa foi a luta do meu governo, desde o primeiro dia, em condições muito mais adversas. É este governo que necessita aprender que a inclusão e a participação verdadeiramente democráticas requerem defesa vigilante das liberdades fundamentais (especialmente de imprensa), autonomia da sociedade civil, separação entre partido, governo e Estado. Como o governo mostra dificuldade em aprender, só há um caminho: votar na oposição.

Mas em qual oposição? Com o devido respeito às demais forças oposicionistas, que deverão estar juntas conosco no segundo turno, há um candidato e um partido que já demonstraram na prática que obedecem aos valores da democracia, da inclusão social e da modernização do País. Já mostraram também que sabem governar. O PSDB e seus aliados lançaram as bases sociais e econômicas do Brasil contemporâneo. Aécio é a expressão deste Brasil. Governando Minas Gerais, fez seu Estado avançar (o Estado tem hoje o melhor Ideb do País no ensino fundamental) e marcou a sua administração por inovações na forma de estabelecer e cobrar resultados. Não foi o único governador a se destacar no período recente, mas esteve sempre entre os melhores.

Meu voto, portanto, será dado a Aécio. Não só por ele, mas pelo que ele representa, como uma saída para a encruzilhada em que nos encontramos.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO



“Não troque o voto por favores. Não venda seu voto. Isto é crime”
Ministro Antônio Dias Toffoli, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE)



DELATOR SERÁ PRESO SE MENTIR AO MINISTÉRIO PÚBLICO

Todas as ações suspensas na Justiça contra Paulo Roberto Costa, sua mulher, duas filhas e genros podem ser retomadas caso o ex-diretor da Petrobras quebre de alguma forma o acordo ou minta em qualquer um de seus depoimentos na “delação premiada”. Ele e sua família também estarão sujeitos a penas de um a quatro anos por mentir sobre detalhes da organização criminosa investigada na Operação Lava Jato.

GRANDES ENROLADOS

A cláusula 20 do acordo de delação do ex-diretor prevê “alterações” ao texto para denúncias que envolvem autoridades com foro privilegiado.

AUTORIDADES GRAÚDAS

Têm foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal deputados federais, senadores, ministros e o presidente da República.

FALOU, RODOU

Caso seja procurado por algum investigado na Operação Lava Jato, Costa é obrigado, segundo o acordo, a acionar a PF ou procuradores.

VAZOU, DANÇOU

O item “i” da Cláusula 23 do acordo de delação premiada prevê sua anulação caso seu sigilo seja quebrado pelo delator, advogado ou MP.

GOVERNO ESTUDA COMO ‘APARELHAR’ O ITAMARATY

Medida cogitada na Casa Civil da Presidência causa grande comoção entre diplomatas: autoriza a nomeação de pessoas de fora da carreira, sem qualificação, para cargos em comissão do Ministério das Relações Exteriores. Argentina e Venezuela fizeram isso, e hoje esses países não têm mais serviço exterior levado a sério mundo afora. O Itamaraty é um dos raros órgãos ainda não inteiramente aparelhados pelo PT.

LULA, 69

Lula completa 69 anos no dia 27, um dia depois o segundo turno, já sabendo se sua candidata Dilma foi reeleita ou não.

FATOR DECISIVO

O deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA) admite que o tempo de TV favoreceu Dilma: “Marina mal teve tempo para se defender...”.

SONHO

O presidente do PMDB, Valdir Raupp (RR), espera que seu partido eleja neste domingo 22 governadores, repetindo a proeza de 1986.

VOTO CONSERVADOR

Neste domingo, dirigentes do PSDB apostam em maior crescimento de Aécio Neves no Sudeste, onde tradicionalmente o tucanato só deslancha na hora agá, fenômeno atribuído ao voto conservador.

PARA O PPS, TANTO FAZ

O PPS apoiará o opositor que disputar o 2º turno contra Dilma. Roberto Freire, presidente do PPS, releva as críticas de Aécio à sua candidata: “não se comparam à sujeira e à desonestidade de Dilma com Marina”.

VENCE E NÃO LEVA

Candidato ao Senado no Maranhão, Gastão Vieira (PMDB) pode ter sua candidatura impugnada: o suplente, Remi Ribeiro, não se desincompatibilizou de cargo na Casa Civil estadual, segundo o blog Atual7, o que o deixa sujeito a anulação do registro da candidatura.

DEIXA VER

O presidente do PTB, Benito Gama (BA), garante que até agora não entrou na pauta do partido qualquer discussão sobre apoiar Marina Silva, caso ela vá para disputa contra a presidente Dilma no 2º turno.

BATE E VOLTA

Dilma viaja cedo neste domingo à Porto Alegre (RS) onde vai votar, mas retorna a Brasília às 9h30, onde aguardará os resultados das eleições às 17h.

MAIS ACEITAÇÃO

Líder do PPS, Rubens Bueno (PR) acredita que é mais fácil reunir aliados pró-Aécio do que aliados pró-Marina no segundo turno, incluindo os rebeldes do PMDB e PP.

BAIXA INSISTENTE

Mapeamento do PDT às vésperas da eleição indica que terá bancada de duas dezenas de deputados federais, inferior ao que o partido já teve na Câmara antes da criação do PSD, de Gilberto Kassab (SP).

COMO VOTA BOLSONARO

Conhecido por declarações homofóbicas e pró-ditadura, o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) considera votar em Levy Fidelix (PRTB) após a “brilhante exposição que tirou Luciana Genro do sério”.

SEGREDO NECESSÁRIO

O voto deve ser mesmo secreto porque, segundo Aparício Torelli, o Barão de Itararé, “só assim, afinal, o eleitor não terá vergonha de votar no seu candidato”.


PODER SEM PUDOR

O ROSTO DO FUTURO

José Sarney foi a sua cidade natal, Pinheiro (MA), para comemorar o seu 50º aniversário. Na praça principal, uma bandeira cobria a obra de arte que o homenagearia. Rufaram os tambores, o locutor anunciou e finalmente a bandeira foi retirada, descobrindo o busto do senador-poeta. O aniversariante ficou desapontado: os olhos arregalados denunciavam o susto diante da expressão envelhecida que o artista atribuiu ao seu rosto de bronze. Refeito, ele sorriu e brincou, vingando-se do escultor:

- Não tem problema. O busto já está pronto para a comemoração do meu centenário...

sábado, outubro 04, 2014

Sair do pântano - MIGUEL REALE JÚNIOR




O ESTADO DE S.PAULO - 04/10



Amanhã se começa a decidir o futuro do Brasil. São 12 anos de governo do PT, que a todo custo pretende permanecer no poder. Lula em discurso recente, segurando os ombros de Dilma, disse pausadamente: "Eles não sabem o que somos capazes de fazer para ter você por mais quatro anos".

Boa parte da sociedade, cerca de 50%, que votará na oposição ao PT, em Marina ou Aécio, no primeiro turno, com certeza teme o que Lula e companheiros possam fazer, mas creio que jamais imaginariam a adoção, na propaganda eleitoral, das táticas desleais próprias do totalitarismo, não sendo admissível que a presidente, com a responsabilidade do cargo, viesse a desinformar a sua população no processo de desconstrução da adversária.

Hitler considerava, como destaca Domenach em conhecido trabalho (La Propagande Politique, Paris, 1950), ter a grande maioria, a massa, disposição a que suas opiniões e seus atos sejam determinados antes pela impressão causada em seus sentidos do que pela reflexão. A tática da propaganda em regime autoritário consiste em alternar terror e exaltação.

O terror infunde-se, como explica em outro trabalho clássico Driencourt (La Propagande, Nouvelle Force Politique, Paris, 1950), pela ligação de situação que a sensibilidade geral aceita integralmente, sem discussão, com uma ideia que se pretende incutir, relacionando-a falsamente com a situação já acolhida. Para a grande maioria, a percepção do papel dos bancos e dos banqueiros é a de explorar os mais fracos e se beneficiar com sua pobreza, refestelando-se com a desgraça alheia para encher as burras (vejam-se juros do cartão de crédito e do cheque especial). A propaganda de Dilma valeu-se dessa posição emocional, aceita sem discussão pela sociedade, e aliou falsamente a proposta de independência do Banco Central a uma liberdade de ação dos bancos comerciais cujo resultado seria o sumiço da comida da mesa dos pobres e a falência da educação, com o desaparecimento dos livros de estudo, ante o sorriso triunfante dos banqueiros.

É evidente a desfaçatez, a desonestidade intelectual, como se o Banco Central, uma autarquia responsável pela definição da política monetária, fosse um banco comercial e sua independência não significasse, como em todos os países desenvolvidos, a garantia de condução da economia e de promoção de estabilidade da moeda, longe dos interesses políticos efêmeros. Pouco importa que Dilma já tenha defendido a autonomia do Banco Central, o que interessa para manter o poder é deslanchar uma artilharia psicológica visando a amedrontar a população, alertando para o desastre da vitória da adversária à qual se atribui, mesmo contra todas as evidências, a instalação do reino dos banqueiros, a desgraça dos pobres com o fim do Bolsa Família. A parcela pensante do eleitorado vê a desgraça em ficar nas mãos de pessoas que mentem descaradamente para assegurar o poder a qualquer custo, como ameaçou Lula.

Hitler, em seu livro Minha Luta, pregava abertamente que a propaganda deve estabelecer o seu nível intelectual segundo a capacidade de compreensão do mais limitado dos seus destinatários. Assim, valeu-se a propaganda dilmista do desconhecimento de boa parte do eleitorado do que seja o Banco Central para unir à proposta de sua autonomia a consequência de plena liberdade dos bancos comerciais, quando a verdade é exatamente o contrário. Sem jamais nenhum candidato ter dito que interromperia o benefício do Bolsa Família, apregoava-se, na propaganda de Dilma, o seu fim iminente com a vitória de Marina ou de Aécio.

Se, de um lado, se cria um clima de terror, de outro se apresenta o Brasil como a Ilha da Fantasia, onde tudo corre às mil maravilhas, com grandes conquistas, num ufanismo graças ao qual se propaga que somos todos felizes e continuaremos felizes se mantivermos Dilma e seu grupo no poder. O cúmulo da exaltação foi a utilização, sem nenhum constrangimento da presidente, da tribuna da ONU na abertura da Assembleia-Geral para falar ao público interno sobre as conquistas do governo Lula e do seu, visando a aparecer nos noticiários televisivos dando a impressão de se constituir numa consagração universal.

Nesta hora de definição, é importante que a decisão seja no sentido de escolher quem possa derrotar Dilma e tenha condições de liderança pessoal para levar à frente a restauração do País nos planos moral e econômico. Marina, por sua trajetória de lutas, pode vir a cumprir esse papel fundamental. E deverá fazê-lo com o apoio do PSDB, tal como sucedeu no governo Itamar Franco, quando esse partido deu respaldo político e massa crítica com a participação de ilustres peessedebistas em órgãos da administração, assegurando governabilidade e condições técnicas para mudar o País, tal como efetivamente mudou com o Plano Real.

O receio de Marina ter sido do PT e ser um PT2 não pode servir de argumento contra a ex-senadora por parte do PSDB, pois todos os seus próceres saíram do PMDB e com ele não mais se identificam, não sendo o PMDB2, muito ao contrário. A origem não indica a linha política atual, a ser apreendida no caminho ora palmilhado, que o programa de Marina revela em muitos temas.

Neste quadro volátil da eleição de amanhã, se Aécio for, por acaso, ao segundo turno contra Dilma, seu passado como governador de Minas o credencia a bem governar o Brasil, mas Marina e o PSB devem se unir ao PSDB, superando os ataques injustos, para compor maioria de sustentação com o PPS de Roberto Freire e o PV, para enfrentar um raivoso PT na oposição. A união é necessária contra a falta total de ética na política, revelada pelas denúncias do conluio da cúpula petista com os "malfeitos" na Petrobrás.

Enfim, ou saímos do pântano onde viceja o aparelhamento do Estado e a corrupção ou submergimos para um afogamento que desonra.

É preciso mudar. Pelo voto - RUTH DE AQUINO




REVISTA ÉPOCA


Não é só pelos 20 centavos. Não é só pela Petrobras. Quem vive um dia normal sabe do que o Brasil precisa


Não basta ajoelhar, tem de rezar. Não basta se alfabetizar, tem de ler até o fim. Não basta ler, tem de analisar. Não basta analisar, tem de lembrar. Não basta papaguear slogans, tem de criticar. Não basta crer em marketing, tem de construir um pensamento crítico. Não basta votar, tem de cobrar.

Falta educação política ao eleitor brasileiro. Faltam consciência, razão, atitude. O programa partidário na televisão, que de gratuito não tem nada, é uma idiossincrasia de país subdesenvolvido. Beneficia quem está por cima. É nocivo, antidemocrático e enganador por dar mais tempo na televisão a qualquer partido que esteja no poder. É um bombardeio de telenovelas eleitorais com efeitos especiais e personagens montados.

Às vésperas do voto de 5 de outubro, o eleitor no Brasil parece suscetível à influência das máquinas partidárias, das mentiras e da hipocrisia de candidatos a todos os cargos. É só observar as tendências do mapa nacional eleitoral, com as múmias e os ladrões, vivinhos e populares.

Penso no eleitor maria-vai-com-as-outras, que prefere não se informar direito, por preguiça, desinteresse ou apego a uma sociedade virtual de rapidinhas mentais, em que se curte ou se demole um texto sem passar do primeiro parágrafo. Dedinho para cima, dedinho para baixo. Adeus às sutilezas, elas só fazem perder tempo. Em vez de ler, posso postar o prato de comida de ontem, as travessuras do cachorro, a descrição detalhada de uma cirurgia, compartilhar textos e vídeos falsos, posso ofender quem discorda ou apedrejar o próximo. Poderia dizer que entendo. Mas não compreendo.

Quando vejo que falsidades sem vergonha rendem votos, penso no voto de cabresto. Não falo do povão nem de classes desfavorecidas. Mas da ignorância – do verbo “ignorar”. Quem ignora é facilmente manipulável pelo marketing sem escrúpulo, não importa a classe social ou o tempo de estudo. É assustador o nível de desinformação dos eleitores brasileiros, especialmente dos mais jovens.

O país que vai às urnas para eleger presidente, governador, senador, deputado federal e deputado estadual é o mesmo que explodiu nas ruas há um ano. Foram protestos, pacíficos e incendiários, contra a roubalheira institucionalizada nos últimos anos, a farra dos desvios de verba pública, a tragédia do transporte, saúde, segurança e educação, a insatisfação com indicadores sociais e econômicos, a volta da inflação, a alta do custo de vida, as alianças espúrias com corruptos.

Será que é o mesmo Brasil? Escândalos como o da Petrobras derrubam presidentes em países com consciência política. No Japão, alguns governantes e executivos se suicidam quando são flagrados num roubo dessa magnitude. Aqui no Brasil, não faz nem cócegas. Dilma Rousseff, no debate de quinta-feira, disse que “todo mundo comete corrupção”. Eu não cometo corrupção. Você comete? Ouvimos esse discurso há três mandatos do PT, o mesmo partido que desfraldou a bandeira da ética na política.

Não adianta desmascarar os elogios de Dilma a Paulo Roberto Costa, o ex-diretor da Petrobras, bandido e atual delator. Todo mundo sabe agora que ele renunciou em 2012 coberto de agradecimentos de Dilma, em ata, “pelos relevantes serviços prestados à companhia no desempenho de suas funções”. Bota relevância nisso.

Por enquanto, Paulo Roberto Costa virou um pária em casa, com tornozeleira eletrônica. Vamos lavar a jato toda a sujeira, afinal ele devolverá quase US$ 26 milhões em contas bancárias no exterior. E lancha, terreno, Range Rover.

Dilma convence o eleitor de que foi ela quem pressionou o Ministério Público e a Polícia Federal a investigar? Daqui a alguns anos, Paulo Roberto se candidata a deputado. O marketing é fácil: o que rouba mas delata, o que rouba mas se arrepende, o que poupa os amigos mais poderosos. Ou então escreve um livro best-seller Como roubei durante oito anos a Petrobras e o Brasil do PT sem que ninguém soubesse.

Não é só pelos 20 centavos. Não é só pela Petrobras. Qualquer um, se vive um dia normal de classe C, se anda de ônibus superlotado, se vai à emergência de um hospital, se tenta abrir um negócio sem despachante, se vai ao supermercado semanalmente, se esconde celular com medo de ser morto, se procura uma creche que não cobre preços extorsivos, se matricula o filho na escola e compra o material, se vai à farmácia, se precisa cuidar dos pais doentes, se convive com os atuais níveis de poluição e péssimo manuseio do lixo, se assiste ao aparelhamento do Poder, sabe hoje que é preciso mudar. Pelo voto.

Um país com medo de ser feliz - PLÁCIDO FERNANDES VIEIRA



CORREIO BRAZILIENSE - 04/10
Volta e meia sou tentado a concordar com De Gaulle ou com quem quer que tenha dito que o Brasil não é um país sério. Nos Estados Unidos, uma escuta telefônica clandestina instalada num comitê de um rival político levou à renúncia o então presidente Richard Nixon. Agora, pense aí: e se flagrassem em vídeo, nos EUA ou na Europa, um deputado do partido governista confessando que uma empresa pública foi usada para fazer campanha de um presidente à reeleição? Imagine o tamanho do escândalo e as consequências.
No Brasil, caro leitor, a questão é tratada com escárnio pelos donos do poder. Veja o caso de Minas Gerais. Um deputado estadual do PT foi filmado se vangloriando do uso dos Correios na campanha de Dilma e de Pimentel. Mesmo diante das imagens incontestáveis da fraude, sabe como a presidente da República reagiu ao ser perguntada sobre o flagrante? "Vocês são jornalistas. Vocês acreditam nisso?". Ou seja: ela está sugerindo que, em vez de se ater ao que o vídeo revela, os jornalistas não acreditem no que veem, mas somente no que ela diz.

Pior é constatar que, diante da prova e da versão oficial, há jornalistas que se desmoralizam ao optar pelo engodo chapa-branca. Na hora de escrever os textos, entre as imagens do que de fato ocorreu e o bla-bla-blá palaciano, eles se comportam bovinamente "neutros", dando ao "desmentido" até mais peso do que à verdade. Ou seja: se, nos EUA ou na Europa, uma bobagem como essa poderia derrubar um governo, aqui o escândalo ajuda é a fortalecer e levar à reeleição.

Escandaliza-me o fato de que a corrupção hoje no país seja tratada como uma virtude. O caso da quadrilha que roubava a Petrobras para distribuir com aliados do governo Dilma e Lula é clássico. Quanto mais se descobrem fatos cabeludos da maracutaia, mais crescem as chances de a presidente se reeleger no 1º turno. As pessoas parecem ignorar que os R$ 10 bilhões desviados dos cofres públicos na Operação Lava-Jato, conforme estimativa da PF, poderiam estar sendo investidos em educação e saúde com "padrão Fifa", como cobraram os manifestantes em junho de 2013. Mas o que vemos é cada vez mais dinheiro no poço da corrupção. É como se o brasileiro, de tão desencantado, tivesse medo de voltar a sonhar em ser feliz. Preferisse ser enganado do que sonhar com a possibilidade de um país mais digno e mais justo para todos.

Sem medo do PT - MERVAL PEREIRA



O GLOBO - 04/10
O debate da Rede Globo de quinta-feira foi o mais acirrado das últimas eleições, e mesmo empolgante em certos momentos. O formato do programa, colocando a cada momento dois concorrentes cara a cara, ajudou muito na sua dinâmica e deu a ele cores novas.

E foi nesse embate olho no olho que um fenômeno ficou explícito: o PT já não mete medo a seus adversários. Seja pela fragilidade da presidente Dilma, tanto nos resultados de seu governo quanto na formulação do seu raciocínio, seja pelos resultados que o partido está obtendo em todo o país, os adversários perderam o medo de se confrontarem com os petistas.


Até mesmo a liderança do ex-presidente Lula está sendo contestada nesta eleição, pois os postes que tentou lançar negaram luz desta vez, seja Alexandre Padilha em São Paulo ou Lindbergh Farias no Rio. Efeito do insucesso dos postes anteriores, a própria Dilma na Presidência e o prefeito paulistano, Fernando Haddad. A trinca de fracassos se fecha com a performance medíocre da ex-chefe da Casa Civil Gleisi Hoffmann, poste de Dilma. Mesmo o provável êxito de Fernando Pimentel em Minas não abafará esses fracassos petistas.

A candidata Marina Silva pôs o dedo na ferida num comentário já com seu tempo esgotado, mas que foi registrado pelos microfones: "A maneira como você fala toda atrapalhada é a maior denunciação..." Era a última chance de Marina, do PSB, e Aécio Neves, do PSDB, firmarem suas posições para uma ampla audiência, em disputa do segundo lugar, e para a presidente Dilma tentar ampliar sua vantagem e fechar a eleição no primeiro turno.

Horas antes, pesquisas do Datafolha e do Ibope mostravam Dilma batendo no seu teto, a poucos pontos da vitória imediata, e os dois rivais em empate técnico, com movimento ascendente do tucano que a pesquisa do Ibope, finda um dia antes da do Datafolha, não captou por inteiro. Provavelmente hoje esse movimento ascensional seja refletido nas últimas pesquisas antes da eleição, já que Aécio saiu-se muito bem no debate.

Ao contrário do que fizeram seus antecessores José Serra e Geraldo Alckmin, nesta campanha Aécio vem defendendo o legado do PSDB sem titubear e, ontem no debate, enfrentado as velhas denúncias do PT contra as privatizações, anunciou a presença do ex-presidente Fernando Henrique na platéia, disse-se honrado com seu apoio e fez ironias com a possibilidade de empresas como as telefônicas ou a Embraer, em vez de privatizadas, ainda pertencerem ao Estado sob o comando do PT:

"Imagine o setor de telefonia, que já funciona tão mal, nas mãos do Estado. A senhora nomeando os dirigentes dessas empresas. Imagine uma Embraer, a grande empresa que compete, hoje, com êxito em outras partes do mundo, nas mãos do PT. Nós fizemos as privatizações de setores importantes. No meu governo, a Petrobras vai ser devolvida aos brasileiros."

Até Luciana Genro, do PSOL, que nestes debates tem feito o papel de metralhadora giratória, também tirou casquinha de Dilma: "Acontece, Dilma, que é o tesoureiro do PT que está envolvido nesse escândalo."

Com a cópia da ata da reunião do Conselho de Administração da Petrobras sobre a saída do diretor Paulo Roberto Costa, preso por corrupção e em processo de delação premiada junto à Justiça, Aécio ressaltou que fora ele quem pedira demissão, e não fora demitido, como afirmava a presidente: "A ata do Conselho da Petrobras diz que o diretor renunciou ao cargo e, pasme, recebe elogios pelos "relevantes serviços" prestados à companhia no desempenho das suas funções. Esse senhor está sendo obrigado a devolver R$ 70 milhões roubados da Petrobras. E o governo do PT o cumprimenta pelos serviços prestados à companhia."

Também Marina foi ao ataque, afirmando que Dilma não cumprira suas promessas de campanha: "A corrupção foi varrida pra baixo do tapete. [...] Você diz que foi o próprio diretor da Petrobras que disse que ia sair porque tinha recebido um recado. Foi negociação premiada. Existe a delação premiada. Houve uma demissão premiada, negociada no seu governo?"

Dilma não encontrou no calhamaço que carrega de um lado para o outro - o formato do debate da Globo deixou mais clara essa dependência - uma explicação razoável para a contradição. Não será surpresa se, em um próximo debate no segundo turno, Aécio ou Marina pedir que Dilma deixe de lado o caderno com as orientações de seu marqueteiro João Santana para responder às perguntas de improviso, no seu peculiar dllmês.

Urnas já consagraram o agro - KÁTIA ABREU




FOLHA DE SP - 04/10


Nas eleições anteriores candidatos evitavam o agronegócio, mas cenário mudou no pleito deste ano


Seja qual for o desfecho das eleições de amanhã, um grande vencedor emergirá das urnas: o agronegócio. Em todos os pleitos anteriores, os candidatos evitavam os empresários do meio rural. Eram "retrógrados", remanescentes de um Brasil "atrasado, escravagista e cruel", cujo apoio era preciso ocultar.

Nesta eleição, bem ao contrário, o que se viu foram os candidatos cortejando o agronegócio, reconhecendo-o como sustentáculo da economia, responsável por um terço dos empregos formais do país e pelos superavit da balança comercial.

O que mudou? Se antes o setor já exibia a pujança atual, por que só agora está sendo reconhecido? Simples: ação política. Antes, o produtor não via necessidade de agir na cena pública e mostrar o que fazia. Não por indiferença à opinião pública, mas por falta de cultura política. Supunha que seu dever se esgotava na produção.

Nesses termos, tornou-se presa de setores ideológicos, cujo projeto revolucionário almeja estatizar a produção rural. E há nisso toda uma engenharia social: antes de se iniciar o processo de invasões sistemáticas a propriedades produtivas, o setor foi submetido a um processo gramsciano impiedoso de desconstrução de sua imagem.

Difundiam-se notícias negativas, mesmo falsas (sobretudo as falsas), expunha-se o produtor como infrator das leis, explorador de seus empregados. Em, pouco tempo, criou-se o ambiente para legitimar, a título de represália, um vasto repertório de arbitrariedades. Proclamou-se a ideia de uma profunda crise social no campo, em que as populações indígenas foram expulsas de suas terras e o cidadão urbano, alheio à realidade rural --sobretudo o meio universitário-- encheu-se de justa indignação e passou a subscrever manifestos e a aplaudir ações contra quem produzia.

Assim, a crise, que não existia, passou a existir. A violência impôs-se no ambiente rural, indispondo patrões e empregados. Perdeu com isso o país.

Diante de tal cenário, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), entidade que representa o setor --de cuja presidência estou licenciada em face das eleições--, decidiu expô-lo. Mostrar o que de fato ocorre e os danos daí advindos não só ao mais moderno setor da economia, mas também ao próprio país.

Isso é política --a política legítima, necessária, indispensável. Quantos documentários, reportagens, manifestos foram divulgados, mostrando o produtor como predador ambiental, contaminador de alimentos, escravagista e coisas do gênero? Ouvimos por anos, em silêncio ou reagindo pontualmente, a essas agressões.

Ao assumir a presidência da CNA, em 2008, dei prioridade à ação política. Nada ficaria sem resposta. Mais que isso: seríamos proativos, não apenas defensivos. Passamos a desfazer a mitologia negativa que nos impuseram e a mostrar, com dados rigorosos, a excelência de nosso trabalho, os avanços tecnológicos que permitem aumentar a produção sem aumentar a área plantada.

Não fosse assim, não teríamos o Código Florestal, vital à segurança jurídica, sem a qual não há investimentos; a área de plantação do país (que é menos de um terço do território) teria sido reduzida e as invasões continuariam sendo aplaudidas.

Hoje, o brasileiro urbano reconhece esse esforço; tem clara noção de que, graças à competente produção rural, paga comida mais barata e de qualidade. Nos últimos anos, o governo federal e o Congresso Nacional vêm dando grande apoio ao setor agrícola e pecuário. Promoveu as concessões privadas para os portos, viabilizou o Código Florestal e deu início às obras de infraestrutura. Há muito por fazer, não há dúvida. Mas criou-se o ambiente necessário para que se faça.

Seja quem for o vencedor, repito, não poderá negligenciar a produção agropecuária. Nem mesmo a candidata que forjou sua carreira hostilizando o agronegócio deixa hoje de reconhecer sua primazia. E essa vitória é, acima de tudo, do país. Vamos às urnas!

Os milagres econômicos da incompetência - ROLF KUNTZ




O ESTADO DE S.PAULO - 04/10



É preciso acreditar em milagres. Só uma incompetência milagrosa poderia produzir estragos tão prodigiosos na indústria brasileira, no comércio exterior e nos fundamentos econômicos do País em tão pouco tempo.

A soma de exportações e importações ficou em US$ 347,96 bilhões entre janeiro e setembro, valor 2% menor que o de um ano antes, pela média dos dias úteis. Diminuíram tanto as vendas quanto as compras internacionais e mais uma vez o Brasil mostrou ao mundo uma perversa originalidade. Recessão, em outros países, tem normalmente um efeito corretivo. No país da presidente Dilma Rousseff, a inflação anual continua acima de 6%. A balança de mercadorias acumula um déficit de US$ 690 milhões em nove meses. O governo central, segundo os números do Tesouro, só conseguiu de janeiro a agosto um superávit primário de R$ 4,67 bilhões, 87,8% menor que o de igual período de 2013. Para atingir a meta, R$ 80,8 bilhões, a administração central terá de obter em quatro meses um saldo superior a R$ 76 bilhões, 16 vezes o alcançado no dobro desse tempo.

Em outros países, governados de acordo com padrões mais normais, políticas de austeridade, às vezes com efeito recessivo, são usadas para corrigir desajustes. O caso brasileiro é muito diferente. Não houve nenhum esforço de ajuste. A recessão foi apenas mais um produto de uma incompetência de raras proporções, assim como o fiasco econômico dos três anos anteriores.

A condição precária do comércio exterior é um espelho dos erros cometidos pela administração petista a partir de 2003. A política industrial nunca foi mais que um arremedo, com tinturas nacionalistas e desenvolvimentistas, de estratégias típicas de outras eras. Nunca se cuidou de fato da eficiência econômica e do poder de competição. A política foi sempre, nos últimos 12 anos, muito mais voltada para o protecionismo do que para a inovação e a produtividade. A isso se acrescentaram estímulos ao consumo bem maiores que os incentivos ao investimento.

No primeiro trimestre deste ano, o coeficiente de exportação da indústria - proporção entre o valor exportado e o produzido - ficou em 19,8%. Nos primeiros três meses de 2007 ainda estava em 22%. Ao mesmo tempo, a participação dos importados no consumo de bens industriais passou de 17% para 22,5%, embora o Brasil tenha permanecido uma das economias mais fechadas do mundo. Os dados são da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Na virada do século os manufaturados ainda representavam mais de 50% do valor exportado. A proporção caiu pouco a pouco e de janeiro a setembro deste ano ficou em 34,8%. No mesmo período de 2013 estava em 36,9%, com peso um pouco maior, mas também muito baixo para uma economia com a base industrial do Brasil,

O governo tem uma desculpa também para isso, como para uma porção de outros problemas. A explicação, agora, é a crise da Argentina, principal mercado de exportação para os produtores brasileiros de manufaturados. Essa versão foi amplamente reproduzida, quando a imprensa divulgou, na quinta-feira, os números do comércio exterior de setembro. Mas ninguém deveria levar muito a sério essa conversa. A crise argentina até serve para esclarecer uma pequena parte da história - só uma pequena parte.

A indústria brasileira vem perdendo capacidade de exportação há muitos anos. As vendas cresceram durante alguns anos, nesse período, mas os produtores tiveram dificuldades crescentes até para preservar sua participação nos mercados. A valorização do real atrapalhou as vendas. Mas uma parte do desajuste cambial é atribuível à inflação, quase sempre maior que a dos concorrentes.

Empresários sempre reclamaram do câmbio valorizado, mas nunca, ou quase nunca, pediram medidas mais sérias para a estabilização dos preços e, portanto, dos custos internos. Acumulada em três anos, uma diferença anual de três pontos porcentuais de inflação pode virar um desastre cambial. A maior parte das pessoas parece desprezar esse detalhe.

Além disso, há o velho e nunca resolvido problema do custo Brasil, formado por uma enorme coleção de ineficiências de origem estritamente nacional. Não dá para culpar o mundo malvado, nem a perversidade das grandes potências, pelo péssimo sistema tributário, pela escassez de mão de obra eficiente, pelas más condições de transporte ou pela incapacidade gerencial do governo - para citar só um pedaço da lista.

Mas pode-se culpar o governo tanto pela incompetência administrativa quanto por erros graves de estratégia. Durante anos, a administração petista aproveitou a onda internacional de crescimento - e especialmente a expansão chinesa - para aproveitar sem trabalho as vantagens do crescimento econômico e do aumento das exportações. Internamente, a transferência de renda alimentou a expansão do mercado consumidor, mas os formuladores da política se esqueceram de cuidar também do aumento da capacidade de oferta.

Sem atenção a outras oportunidades, o governo aceitou também a transformação do Brasil em fornecedor de matérias-primas para a China e de manufaturados para economias em desenvolvimento, especialmente da vizinhança sul-americana. Foi uma escolha ideológica, apresentada como estratégia inovadora pelos formuladores da diplomacia petista.

Isso explica a vulnerabilidade do País à crise argentina. Ao renegar a política de inserção nos mercados desenvolvidos, o governo deixou à indústria brasileira, até por falta de uma estratégia modernizadora, poucas opções além de jogar na segunda divisão. Mas potências mais competitivas, como a China, podem invadir esse mercado e atropelar os competidores menos eficientes. A indústria brasileira tem perdido espaço também na vizinhança. De milagre em milagre, o Brasil recua à condição de colônia dependente de uma metrópole importadora de matérias-primas.

Depois do show eleitoral - ALBERTO DINES




GAZETA DO POVO - PR - 04/10


A polarização extravasou as postulações, chegou à gramática e ao protocolo: apoiadores da candidata Dilma Rousseff consideram traição não referir-se a ela como “presidenta” enquanto seus adversários agarram-se à designação que consta na Constituição. A desavença vai além: para alguns, a “desconstrução” do oponente ameaçador é estratégia política válida; para outros, é uma forma velada de fraudar.

Nos últimos dias, diante da exaltação crescente, avulta nova controvérsia: este pleito é, ou não, o mais violento desde a redemocratização? De novo, os mesmos alinhamentos: enquanto os apoiadores da candidatura oficial exibem um clima de normalidade e respeito às regras e bons costumes, eleitores oposicionistas denunciam um escancarado vale-tudo.

A pendência remonta a abril de 2013, quando Eduardo Campos ensaiava os primeiros passos como candidato independente da base aliada e a presidente Dilma, em uma visita oficial à Paraíba, ofereceu uma de suas preciosidades retóricas: “Podemos fazer o diabo quando é hora de eleição, mas quando se está no exercício do mandato, temos de nos respeitar, pois fomos eleitos pelo voto direto”.

O que significava exatamente “fazer o diabo”? Um friforó (free for all), no melhor estilo western? Porventura não estava no pleno exercício do seu mandato ao metralhar, ou desconstruir, a candidata que a ameaçava? O que significa hoje “fazer o diabo”?

Águas passadas: ano e meio depois, na véspera do renhido primeiro turno (que alguns esperam ser o único), vale a pena refletir sobre o nível de ensandecimento do confronto sucessório. Parte dessa exaltação decorre da explosiva mistura de religião com política que agora alcança uma veemência próxima do fanatismo. Outra parte vem da forte sensação de instabilidade fomentada pela renitente inflação, com o seu poder de ressuscitar fantasmas ainda não aposentados.

Impossível ignorar o terceiro componente da atual fervura, representado pelas revelações sobre os escândalos na Petrobras. Os sucessivos e crescentes espantos com o nível da corrupção nacional não se comparam ao impacto causado pelas denúncias e delações na empresa-símbolo nacional.

O corruptômetro atingiu seu limite máximo e, associado à simultânea descoberta do esquema de propinas no alto comando das tropas de elite da PM do Rio (outra entidade-símbolo), traz a roubalheira para perto da insegurança pessoal e alimenta uma indignação já não apenas cívica ou moral.

A candidata-presidente terá de agir com uma energia ainda não exibida nesses quase quatro anos de mandato. E isso já no day after, a próxima segunda-feira. Como no Brasil o candidato à reeleição não é obrigado a licenciar-se (o que seria uma boa solução – para isso existe o cargo de vice-presidente), alguma coisa impactante e consensual precisará ser feita além das “providências cabíveis”.

O espírito de junho de 2013 não foi desativado. Ao contrário, está em ponto de ebulição. O debate entre os candidatos na última quinta-feira, aparentemente civilizado, foi um show de enganações montado pelo conjunto de gênios do marketing político. Prodígio de virtualidade. Não revela o que há de real na fatigada sociedade cordial.


Corrupção eleitoral - CRISTOVAM BUARQUE




O GLOBO - 04/10

Fraude pela mentira é grave porque perverte a própria democracia


O Brasil descobriu o quanto o seu sistema político-administrativo é corrupto no comportamento de seus dirigentes. Não percebeu ainda as outras formas de corrupção que este sistema carrega.

Mesmo quando um político ou administrador não desvia dinheiro para sua conta pessoal, ele está sendo corrupto quando desperdiça recursos, beneficia apenas privilegiados, depreda o meio ambiente, aumenta a violência, provoca escassez ou inflação. Esta é uma forma discreta, às vezes mais grave, de corrupção, pelo seu tamanho e duração nos impactos negativos dos resultados. Por exemplo, em um tempo em que a população não tem água potável, nem tratamento de esgoto e as escolas estão degradadas, é corrupção construir prédios públicos suntuosos, mesmo sem apropriação privada do dinheiro público.

Outra corrupção política é a velha fraude eleitoral que foi praticada no Brasil ao longo da história. As urnas eletrônicas permitem imaginar que esta corrupção foi eliminada, pelo menos até quando algum hacker for capaz de manipular os dados eleitorais. Se esta corrupção parece superada no momento, a atual eleição tem sido exemplo de outra corrupção eleitoral pelo sistemático uso de marketing com mentiras para desconstruir imagens de oponentes. É a corrupção do tipo Joseph Goebbels.

O debate e o enfrentamento de ideias são características fundamentais da democracia. Seria extremamente positivo um debate sério sobre o impacto da autonomia do Banco Central: se esta é uma forma de proteger a moeda ou, ao contrário, de entregá-la à voracidade do sistema financeiro. Mas uma forma de corrupção eleitoral é repetir, até virar verdade na opinião do eleitor, que a autonomia do Banco Central seria a forma encontrada por uma candidata para tirar comida da mesa dos pobres e enriquecer os ricos banqueiros. Dizer que um candidato vai desfazer programas sociais que estão previstos no próprio programa do candidato também é uma forma de corrupção.

A fraude pela mentira é grave porque perverte a própria democracia, graças aos truques de marketing que transformam mentiras em verdades. A fraude corrompe por meio do desconhecimento que o eleitor tem da realidade e pela dificuldade de analisar os discursos no curto período eleitoral. Nas últimas semanas, o candidato Aécio acusou Marina de ser o mesmo que o PT, a candidata Dilma acusou Marina de ser igual ao PSDB e o eleitor acreditou nas duas afirmações, mesmo que uma anule a outra.

Ninguém pode criar regras para impedir a mentira nas campanhas. A única maneira de abortar a corrupção eleitoral da mentira é educar o eleitor. Eis a maior das corrupções da política no Brasil: o desprezo à educação de nossas crianças e, consequentemente, à da população. A esperteza praticada pelo político é a mãe da corrupção, o pai é o desconhecimento do eleitor. Talvez, por isso, a esperteza não trabalhe para eliminar o desconhecimento.

Educação sem base - CORREIO BRAZILIENSE





CORREIO BRAZILIENSE - 04/10
A educação básica no Brasil é mantida, em grande parte, pelo Fundo de Financiamento da Educação Básica (Fundeb), que garante o investimento mínimo anual, por aluno, em R$ 2.022,51 (referência 2013). O Fundeb - regulamentado pela Lei nº 11.494/07 - é voltado, exclusivamente, para a escola pública estadual. Ali se concentram os custos mais elevados pela natureza do planejamento didático e pela duração das séries de cada grupo de estudo. Há sete anos, os recursos foram ampliados em 22% em relação às antigas complementações financeiras para as escolas.
O dinheiro repassado pelo Fundeb tem peso substantivo nas regiões Norte e Nordeste, nas quais as unidades escolares funcionam aquém dos parâmetros médios aferidos pelos municípios de áreas mais desenvolvidas do país, como mostra o Índice de Desenvolvimento Básico da Educação (Ideb). Mas o reforço financeiro federal não foi capaz de influir na qualidade do ensino das redes públicas estaduais, o que demonstra que dispor de recursos financeiros é de medular importância, mas, caso eles não sejam bem gerenciados, a qualidade fica sempre a desejar.

Certo é que as transferências evoluíram de R$ 2,9 bilhões em 2007 para R$ 9,2 bilhões em 2013. Além do expressivo suporte liberado anualmente pela União aos estados, o fundo dispõe de outros meios para suplementar despesas das redes públicas. No ano passado, foram R$ 116 bilhões, destinados ao pagamento da complementação de salários de professores, compra de equipamentos e manutenção da merenda e do transporte escolares.

Levantamento da Controladoria-Geral da União (CGU) realizado em 2013 em 120 municípios revelou que em 73% deles houve desvio de verbas. O setor da educação no país está quase sempre envolvido por escândalos, quase nunca apurados. Constata-se, pois, que os estados não conseguiram melhorar a qualidade do ensino básico, como avalia o Ideb. O Ministério da Educação admite que há necessidade de aumentar o acompanhamento do emprego dos recursos liberados aos estados e municípios.

Caso fosse bem administrada, boa parte da verba do Fundeb poderia até formar reserva para a ampliação das atividades. Contudo, são raros os gestores comprometidos com a melhoria da merenda ofertada aos alunos, com o aprimoramento do transporte escolar e das condições das escolas. Que os novos governantes - presidente e governadores - reflitam e monitorem o dinheiro do Fundeb desde a saída de Brasília até o emprego nas cidades. Do contrário, o Brasil continuará a conviver com educação carregada de estatística, porém, sem o resultado proativo que se deseja para ela.

O preço da pressa - EDITORIAL O ESTADÃO




O ESTADO DE S.PAULO - 04/10


Foi decepcionante para o governo o resultado financeiro do novo leilão de internet por telefonia celular móvel de quarta geração (4G). Muito mais interessado no dinheiro que poderia arrecadar com a concessão desses serviços do que nos efetivos benefícios que eles poderão trazer para o usuário - conexão bem mais rápida, ampliação da área de cobertura, economia, entre outros -, o governo receberá pouco mais de 60% dos R$ 8,2 bilhões que esperava obter caso todos os seis lotes oferecidos fossem arrematados com ágio expressivo.

Contrariando o interesse e a disposição das operadoras, o Ministério das Comunicações forçou a rápida realização do leilão, para apropriar-se dos resultados ainda este ano e, assim, evitar a deterioração mais aguda das contas públicas. Uma grande operadora desistiu de participar do leilão, não houve disputa pelos lotes leiloados (por isso o ágio foi próximo de zero) e dois lotes ficaram sem nenhuma oferta. O governo pagou por sua avidez.

A pressa, determinada pela necessidade de fazer caixa para ampliar o superávit primário - economia necessária para o pagamento dos juros da dívida -, prejudicou o Tesouro. O Ministério da Fazenda tem afirmado que conta com outras fontes de recursos para alcançar o resultado primário prometido para este ano, de R$ 80,8 bilhões, embora até agosto tenha acumulado apenas R$ 4,67 bilhões - ou seja, nos quatro últimos meses do ano terá de apresentar um resultado positivo de R$ 76,13 bilhões.

Embora as principais operadoras considerassem o momento inadequado para a realização de investimentos vultosos, como os que serão exigidos, o governo insistiu no leilão da faixa de 700 megahertz (MHz) da telefonia móvel, dividida em seis lotes, cujo preço mínimo total era de R$ 7,7 bilhões. O governo esperava ágio de 6,5% sobre esse preço (o ágio nos quatro lotes arrematados ficou em 0,65%, apenas um décimo do esperado).

Para tentar mostrar que não havia riscos para o êxito do leilão, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, garantia há meses que as quatro grandes operadoras do País participariam da disputa e que pelo menos dois grandes grupos do exterior, que ainda não atuam no Brasil, tinham interesse nos lotes a serem leiloados. Não foi o que se viu no leilão.

Apenas três operadoras nacionais (Claro, TIM e Vivo) e uma regional (Algar) ofereceram lances. Às voltas com problemas societários, a quarta operadora (Oi) nem se inscreveu para participar da disputa. Com a ausência desta operadora, não houve interessados para dois lotes. Um deles abrangia dois municípios do Paraná, mas o outro compreendia todo o território nacional excluídos a área do outro lote não arrematado e os 87 municípios incluídos no lote adquirido pela operadora regional.

O leilão rendeu R$ 5,851 bilhões, mas, desse valor, o governo deverá descontar R$ 874,4 milhões, que é sua parte no custo de R$ 3,6 bilhões da chamada "limpeza" da faixa de 700 MHz, isto é, a retirada dessa faixa dos canais de TV analógicos que hoje a ocupam e a compra de equipamentos para que essas emissoras transmitam em outra frequência, digital. Assim, com o novo leilão do G4 o governo arrecadou R$ 4,98 bilhões líquidos, ou 39% menos do que pretendia obter.

Tendo forçado a realização do leilão nas atuais circunstâncias, o ministro Paulo Bernardo acabou reconhecendo que as coisas não saíram como ele esperava. "Do ponto de vista do Tesouro, é negativo que a arrecadação tenha sido menor. Do ponto de vista do Ministério (das Comunicações), não vamos desenvolver o setor como queríamos", admitiu.

No leilão de 4G na frequência de 2,5 gigahertz (GHZ), em junho de 2012, o governo obteve R$ 2,93 bilhões. O ágio em alguns lotes chegou a 67%. Agora, com espectro de frequência mais amplo, as operadoras terão mais capacidade para oferecer serviços de internet de banda larga móvel, por meio de smartphones e tablets. E a um custo menor, pois a faixa de 700 MHz permite maior cobertura com menos antenas. Os serviços nessa frequência serão oferecidos a partir de 2019.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO


“Nossa ideia é instalar uma operação Granero em Brasília”

Walter Feldman (PSB) imaginando uma fila de caminhões de mudança de petistas


DELATOR PODE ADERIR à ‘PROTEÇÃO DE TESTEMUNHA’

São tão graves as revelações do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, que seu acordo de “delação premiada” com o Ministério Público Federal prevê seu ingresso “imediato” no “programa federal de proteção ao depoente especial”. Isso foi incluído no acordo para garantir sua segurança, de sua mulher, de duas filhas e genros, caso qualquer um venha a ser ameaçado seriamente pelos delatados.

NA MÃO DO ESTADO

Caberá ao Ministério Público Federal, à Polícia Federal e à Justiça Federal do Paraná garantir a segurança de Costa e sua família.

SE HOUVER AMEAÇA

O pedido para ingressar no programa de proteção a testemunhas pode ser feito pelo próprio Paulo Roberto ou seus advogados.

COM PASSAPORTES

Pelo acordo, o Ministério Público Federal se compromete a ajudar a liberar os passaportes de Paulo Roberto Costa e família, após 1 ano de prisão domiciliar.

DELATOR SEM DELAÇÃO

O acordo de delação premiada deixa explícito que nem o próprio delator terá cópias dos depoimentos e provas que cedeu ao MPF.

CHANCELER AMEAÇA RETALIAR DIPLOMATAS ANTIDILMA

O ministro Luiz Figueiredo (Relações Exteriores) adora alimentar sua birra contra diplomatas, na maioria jovens, que se expressam em suas páginas pessoais no Facebook criticando o atual governo ou apoiando a oposição. Em jantar recente com diplomatas na embaixada do Brasil em Washington, ele se queixou de novo desses colegas e disse textualmente: se Dilma ganhar, não poderia “aproveitar esse pessoal”.

CHAVISMO LIGHT

A perspectiva de reeleição de Dilma provoca nervosismo no Itamaraty, ante os indícios de que o País caminha para um certo “chavismo light”.

TIRO NO PÉ

O tal “chavismo light”, advertem experientes diplomatas, comprometeria a capacidade do Itamaraty de implementar políticas de Estado.

‘REGULAÇÃO’ FASCISTA

A guinada de Dilma se une à “regulação da mídia” – fantasia petista de inspiração fascista – que ela prometeu a blogueiros que a bajulam.

DUDA COM SKAF

Já assediado para eventual segundo turno das eleições presidenciais, o marqueteiro Duda Mendonça avisa: seu compromisso é com Paulo Skaf, candidato do PMDB ao governo de São Paulo.

GANHOU O DEBATE

Os tucanos ficaram animados com pesquisas até de outros partidos indicando que Aécio Neves foi o candidato de melhor desempenho, no debate promovido quinta-feira (2) pela Rede Globo.

PROBLEMA DELA

Candidato a vice de Marina Silva, o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS) afirmou que a ordem é “partir para cima”: “Quem tem que responder a perguntas é Dilma, especialmente sobre corrupção”.

RUSSOMANNO DE SAIAS

O PSDB tem esperança de que Marina sofra o mesmo fenômeno de Celso Russomanno (PRB) nas eleições de 2012 para prefeito de São Paulo: após o boom inicial, nem sequer conseguiu ir ao 2º turno.

PESOS E MEDIDAS

Luizianne Lins (PT) tem um motivo a mais para trabalhar por Eunício Oliveira (PMDB), candidato a governador. O suplente dele é Waldemir Catanho, carne e unha com a ex-prefeita de Fortaleza.

DERROTA É A CHANCE

Vítima da omissão do nosso governo, e mantido 452 dias em cubículo na embaixada do Brasil em La Paz, o ex-senador Roger Pinto Molina vê numa derrota de Dilma a chance de, finalmente, obter refúgio político.

MARINA SABE

“Com Marina ou Aécio, seria mais fácil resolver a situação”, diz Molina. Por ser do Acre, Marina conhece o problema do narcotráfico e das perseguições políticas contra a oposição boliviana.

SALADA ELEITORAL

Apesar de pertencerem a grupos rivais, pesquisas apontam que Gastão Vieira (PMDB), que se descolou do clã Sarney, tem grande chance de ser eleito ao Senado ao lado de Flávio Dino (PCdoB) ao governo.

OLHANDO BEM...

...se fosse mais nova, poder-se-ia dizer que a candidata a presidente Luciana Genro (PSOL) foi separada do zagueiro David Luiz no berço.


PODER SEM PUDOR

OOOPS, ERREI!

Em junho de 1991, deputado tucano, o desligado José Serra visitava Washington e foi almoçar na casa do embaixador Marcílio Marques Moreira. Desceu do táxi, bateu à porta e entrou. A empregada, cucaracha, avisou que o embaixador ainda não havia chegado. À vontade, Serra disparou telefonemas por conta da embaixada e, após folhear livros e mexer em papéis, descobriu meia hora depois que entrara na casa vizinha, do embaixador da Bolívia.

O curral eleitoral e seu poder na eleição - ALOÍSIO DE TOLEDO CÉSAR

O ESTADO DE S.PAULO - 03/10


Os mais jovens talvez nunca tenham ouvido a expressão "curral eleitoral". Nem "voto de cabresto". O que será isso?, perguntaria a menina de 15 anos ao avô.

Quando foi proclamada a República, a Constituição federal brasileira tardou em prever a figura do voto secreto e, com isso, as primeiras eleições no País se realizaram por um sistema que permitia identificar a pessoa em quem o eleitor votava. Realmente, naqueles tempos nada saudosos, o eleitor levava consigo um pedaço de papel com o nome de seu candidato e o depositava na urna, permitindo que os coronéis da época entregassem a cada um de seus empregados uma cédula já preenchida.

E lá seguia o eleitor de cabresto para cumprir o dever de votar naquele político de quem era dependente.

Graças a esse sistema nada democrático, ganharam força as expressões "voto de cabresto" e "curral eleitoral", porque, sobretudo no Nordeste, os políticos mais poderosos adotavam essa conduta para garantir os seus votos. Sim, a grande maioria dos eleitores, por dependerem economicamente desses "coronéis", recebia pelo voto um pagamento de diversas formas - comida, roupas, casa para morar e até mesmo dinheiro.

Curiosamente, esse costume se arraigou de tal forma em nosso sistema de escolha dos governantes que hoje temos talvez o maior curral eleitoral de todos os tempos. Há uma diferença: na sua fase inicial, os eleitores "de cabresto" recebiam o pagamento do próprio político ao qual estavam submetidos, mas hoje, no enorme curral eleitoral do presente, quem paga a esses eleitores somos nós.

Nisso talvez resida a conhecida esperteza do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - como sempre, uma esperteza para o mal. Tendo Lula percebido que é bom em cada eleição poder contar com um curral eleitoral obediente e confiável, ele carreou esforços (e o nosso dinheiro) para pagar a esses eleitores na forma disfarçada de Bolsa Família e outras benesses governamentais.

Por incrível que pareça, essas pessoas, que não recebem a necessária instrução e por isso mesmo são mais fáceis de se deixar conduzir, se tornaram dependentes economicamente do atual governo e representam a grande força da candidata oficial, Dilma Rousseff. Não será exagero admitir que tais eleitores poderão decidir a eleição deste domingo, pois representam uma massa de votos que os pesquisadores calculam em até 40 milhões.

As pesquisas têm demonstrado que nas áreas de pessoas de melhor instrução (a educação liberta), a candidata oficial não detém tão grande apoio. Mas quando envolve dependentes do Bolsa Família, a adesão à sua candidatura é quase unânime.

Isso equivale a dizer que o nosso dinheiro, aquele que é coletado dos impostos pagos por cada um de nós, está servindo para beneficiar o projeto político de um grupo que chegou ao poder, gostou disso ao extremo e não quer mais sair (até porque, se sair, sabe que os riscos de uma devassa serão incalculáveis).

Esses eleitores de cabresto estão comprando geladeiras, televisões, comendo melhor, e isso, sem nenhuma dúvida, é melhor do que viver na faixa da pobreza extrema. Mas como recebem de graça, sem que tenham realizado nenhum trabalho que mereça a devida retribuição, torna-se elementar o paternalismo, inimigo antagônico do livre desenvolvimento.

Sem dúvida alguma, os programas sociais das Bolsas Família e outros deveriam ter sido complementados por outras providências que proporcionassem efetivo desenvolvimento educacional e econômico e, enfim, libertassem os assistidos, ao invés de deixá-los numa dependência que é contrária ao interesse do País. Carentes de instrução e sem alcançar a liberdade que o saber proporciona, permanecem socialmente anestesiados e sempre esperando o dia de receber os valores do governo federal.

Para essas pessoas, fatos de extrema relevância como o mensalão e a farra com o nosso dinheiro na Petrobrás, por exemplo, nem sempre têm relevância, nem são objeto de preocupação. O que as preocupa mesmo é o dia de receber o dinheirinho do patrão governo, porque, afinal, é necessário pagar a prestação da geladeira, da televisão e mesmo do primeiro automóvel. Dois anos atrás houve o rumor de que não seria feito tal pagamento e isso provocou uma enorme correria aos bancos, somente acalmada com a abertura dos caixas para que cada um o recebesse.

É muito triste observar que essas pessoas votam muito mais com o estômago do que com a cabeça. Superar tal poder eleitoral é tarefa muito difícil para os candidatos da oposição, pelo círculo vicioso suicida: se condenam e denunciam a sistemática eleitoreira do tipo Bolsa Família, isso significa renunciar a esses milhões de votos; por outro lado, se aceitam e dizem que vão manter esse programa assistencial, no caso de eleitos, acabam convalidando a prática que fortalece a candidata oficial.

Criou-se no País, portanto, por força dessa conduta condenável, uma forma de realizar eleições que premia exatamente a pessoa que deveria ser punida por usar dinheiro público em seu próprio favor. É possível que tal sistema, contrário ao próprio País, só venha a ser repelido a partir do momento em que o aprimoramento educacional e o desenvolvimento econômico libertarem esses milhões de brasileiros da dependência quase escrava de um governo contrário aos princípios morais e de respeito à verdadeira democracia.

Mas como não são feitos na área da educação tais esforços e investimentos, criou-se a impressão de haver o propósito de deixar tudo como está porque, afinal, esses eleitores são fáceis de manobrar. Enfim, parecemos estar condenados a viver num país que vai a cada dia encolhendo, ao invés de crescer.

Detalhes eleitorais - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 03/10
Em momentos tensos como os da reta final desta eleição presidencial, em que se disputa ainda quem vai para o segundo turno ou, no limite, se a disputa termina já no primeiro turno com a reeleição da presidente Dilma, as teorias da conspiração andam soltas e, junto com muitas desconfianças indevidas (se as urnas eletrônicas são seguras é uma pergunta muito comum nestes últimos dias), surgem ações, como a dos Correios a favor do PT, que justificam o alerta que está sendo dado.

A confissão do deputado petista de que "há o dedo" dos militantes petistas dos Correios na subida de intenção de votos da presidente Dilma em Minas é de uma clareza exemplar, e o presidente dos Correios, Wagner Pinheiro, ouvindo tudo aquilo calado, como se estivesse recebendo um elogio. No fundo, era um elogio mesmo o que o deputado estava fazendo.


O aparelhamento dos Correios pelo PT parece ter efeitos disseminados pelo país, prejudicando principalmente candidatos a deputado federal de outros partidos em diversos estados. O PSDB está recebendo informações de candidatos de outros partidos que também estão se considerando afetados por essa estranha falha seletiva dos Correios.

Fatores extracampo podem afetar o resultado da eleição, ainda mais quando a nossa Justiça Eleitoral, como todo o aparelho judicial, é lenta. Os repetidos casos de governadores que são cassados depois de exercerem a maior parte de seus mandatos não nos deixam mentir.

Aliás, caminhamos para uma grave crise institucional no próximo governo, seja qual for o eleito. O processo em curso da delação premiada do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e do doleiro Yousseff vai colocar no caminho da cadeia uma leva de políticos e autoridades que serão eleitos dentro de poucos dias. A acreditar nas palavras do ministro Teori Zavascki, são deputados, senadores e governadores que se locupletaram com as verbas da Petrobras.

Disse o ministro do supremo tribunal Federal, ao chancelar o acordo de delação premiada, que há nos depoimentos de Paulo Roberto indicações de "vantagens econômicas ilícitas oriundas dos cofres públicos" (...) "distribuídas entre diversos agentes públicos e particulares" Confirmando o noticiário que tem saído na imprensa, Zavascki disse que "(...) há elementos indicativos, a partir dos termos do depoimento, de possível envolvimento de várias autoridades detentoras de prerrogativa de foro perante tribunais superiores, inclusive de parlamentares federais".

Além do STF, portanto, governadores que têm foro no Superior Tribunal de Justiça (STJ) estão na lista dos denunciados. Esse é um tema que continuará pautando os debates políticos nesta eleição e que pode afetar o resultado dela caso surjam novos vazamentos dos depoimentos.

Outro fato que pode afetar o resultado final da eleição, especialmente na definição de quem será o adversário da presidente Dilma no segundo turno, é a estrutura partidária, o que favorece o candidato tucano, Aécio Neves. Referindo-se à eleição de 1989, de que ele participou como um dos apoios políticos do então candidato Collor de Mello, o dirigente nacional do PTC Daniel Tourinho acha que a candidata do PSB, Marina Silva, em razão da fragilidade da sua estrutura partidária, deverá perder algo em torno de 4% dos votos no dia da eleição, e, em sentido inverso, o candidato do PSDB, com uma estrutura partidária muito mais capilarizada, deverá crescer cerca de 4%.

Ele lembra a eleição de 1989, quando, logo após a apuração do primeiro turno, a primeira pesquisa dava a Collor uma vantagem de 15 pontos percentuais frente a Lula. À véspera da eleição, porém, essa diferença estava reduzida a 1%. Ou seja, um quadro claro de ascensão de Lula e queda de Collor. Ao final da apuração dos votos do segundo turno, o resultado apontava a vitória de Collor com 5% de votos a mais do que Lula.

Para ele, a fragilidade da estrutura partidária da candidatura de Lula àquele tempo ante a que dava apoio a Collor fez a diferença. 

A navalha de Hanlon - MONICA BAUMGARTEN DE BOLLE




O ESTADO DE S.PAULO - 03/10


"Jamais atribua à malícia aquilo que pode ser adequadamente explicado pela estupidez", frase epônima (atribuída a Robert J. Hanlon) que ilustra perfeitamente como se devem considerar os desmandos da economia brasileira. Acham que a degradante situação fiscal do Brasil resulta das artimanhas astutas de Arno Augustin? Pensam que Guido Mantega é maroto quando afirma que a súbita desvalorização do real é fruto do fortalecimento do dólar mundo afora? Pensem novamente. Pensem em Hanlon.

O Brasil registrou o pior resultado fiscal para o mês de agosto na história. Estamos firmemente entranhados no território do déficit primário, coisa do passado, estilo anos 90, com um crescimento dos gastos públicos de quase 30% no mês. Vá lá que a presidente Dilma não goste de austeridade, fala mal da austeridade para quem quiser ouvir, inclusive para a chanceler alemã, Angela Merkel, num inominável gesto de falta de malícia. Mas não precisávamos ir tão longe, não era necessário nos colocarmos tão próximos da queda, cada vez mais perto do rebaixamento da classificação de risco. Ou precisávamos? Confesso que já não sei, tamanha a confusão da economia brasileira.

Sem muito o que dizer de diferente neste artigo publicado às vésperas do primeiro turno - pesadelo para qualquer colunista -, andei relendo o que escrevi neste espaço nos últimos quatro anos. A conclusão: a bagunça econômica certamente não se deve a qualquer malícia ou esperteza do governo. Foram atos sequenciais de... bem, chamemos de "falta de bom senso". Augustin, o chefe do Tesouro, diz que é possível alcançar a meta fiscal de 2014 e que os resultados apresentados não são tão ruins quanto parecem. Falta de bom senso exemplar.

O Brasil tem um rombo nas contas públicas. O Brasil também tem um rombo nas contas externas. Como constatou o FMI no mais recente World Economic Outlook (WEO), tínhamos um superávit na conta corrente de 1,3% do PIB em 2006, que se transformou em déficit de 3,6% do PIB em 2013. Isso equivale a US$ 81 bilhões,valor que, em termos absolutos, só fica atrás dos EUA e do Reino Unido, países diretamente afetados pela crise financeira de 2008. Países que, além de apresentarem claros sinais de recuperação, têm moedas ainda consideradas fortes, moedas de reserva internacionais - o dólar, a libra. Quem quer reais às vésperas das eleições brasileiras?

O FMI também destacou que, com um déficit externo dessa magnitude, o Brasil aproxima-se da zona de perigo, aquela em que qualquer soluço nos mercados globais pode se transformar em fuga de recursos do país. Ou seja, em mais desvalorização do real e uso ainda mais amplo das reservas internacionais para conter o enfraquecimento da moeda. Com a inflação no nível em que está, flertando sistematicamente com o teto do regime de metas, 6,5%, o Banco Central não pode se dar ao luxo de fazer outra coisa. Não chegamos até aqui por malícia.

Fica estabelecido, pois, que enfrentamos situação conhecida como "déficits gêmeos": um rombo nas contas públicas, outro na conta corrente. Agora, vejam o que mais o FMI tem a dizer. Num dos capítulos analíticos do recém-divulgado WEO, há sólidas evidências de que o investimento público em infraestrutura aumenta o nível de atividade tanto no curto quanto no longo prazo. Isso sugere que, para países que têm muita necessidade de infraestrutura a fim de alcançar patamares mais elevados de crescimento, não há melhor momento do que o atual, quando as taxas de juros internacionais são baixas e assim devem permanecer. Nessas condições, projetos de investimento financiados por endividamento público podem ter grandes efeitos sobre o crescimento sem aumentar muito a relação dívida/PIB. Contudo, é preciso contar com recursos da poupança pública, o que não temos.

O Brasil desperdiçou inúmeras possibilidades nos últimos anos que poderiam ter posto o País em outro patamar de crescimento, de solidez. Jogou fora a chance de aumentar o investimento público com recursos da poupança inexistente do governo.

É muita malícia, não?

 

 

 

 

 

A urna de domingo e os ladrões - REINALDO AZEVEDO





FOLHA DE SP - 03/10

Paulo Roberto Costa era apenas um tipo comum. Jamais seria incluído numa lista de mais influentes nem era chefe de nada. Não levava jeito para "capo di tutti i capi". Permaneceu por nove anos à frente da diretoria de Abastecimento da Petrobras. Chegou pelas mãos do PP e, bom rapaz, foi logo adotado pelo PT e pelo PMDB.

Lula, que sempre soube empregar o diminutivo com grande eficiência, o chamava de "Paulinho". Há "Paulinhos" à mancheia nas outras estatais, nos fundos de pensão, nas autarquias, na alta administração federal, em toda parte. Os "Paulinhos" sem rosto são mais influentes na República do Babalorixá de Banânia do que os eunucos no Império Persa.

Costa está em prisão domiciliar, ornado por uma tornozeleira eletrônica. No acordo de delação premiada, aceitou devolver aos cofres públicos espantosos R$ 70 milhões. É o que admite ter capturado, em proveito próprio, como operador do esquema criminoso, suprapartidário e governista, incrustado na estatal. Ele separava para si, note-se, apenas uma pequeníssima parcela do saque. Quanto levavam seus "chefes"?

Um termo de comparação: o mensalão, segundo Roberto Gurgel, ex-procurador-geral da República, distribuiu R$ 141 milhões em propina. No petrolão, um corrupto menor assume que a, digamos, taxa de administração da canalhice lhe rendeu o correspondente a 50% do que movimentou um dos maiores esquemas de corrupção da história do país.

Dado o tamanho do Estado no Brasil, é forçoso concluir que vivemos sob a permanente rapinagem de uma súcia. Se uma empresa como a Petrobras não dispõe de um sistema de "compliance" que a torne imune a práticas dessa natureza, pode-se imaginar a desenvoltura com que atua a bandidagem em áreas bem menos expostas à curiosidade pública e desobrigadas de fazer ao menos a mímica da boa governança corporativa.

Não obstante, o estatismo goza de grande prestígio no Brasil, especialmente junto a acadêmicos, artistas e jornalistas, que ajudam, sim, a formar opinião e a plasmar consensos. Os escândalos na Petrobras se tornaram tema de campanha –e nem poderia ser diferente. Mas nós os estamos debatendo como se fossem apenas casos de polícia, e esta é a sua face menos importante. O assalto organizado à Petrobras é um caso de política.

Há quatro eleições já, incluindo a deste ano, o petismo sufoca o país com a sua ladainha estatista, que só interessa à burguesia sindical do capital alheio e, portanto, aos aparelhos que garantem a influência e o poder do próprio... petismo.

Os verdadeiros espoliadores do Brasil, a "classe" de fato dominante, são justamente aqueles que saem por aí a falar em nome da igualdade e da justiça social. Praticam a forma mais porca e perversa do discurso ideológico, que é a do mascaramento da verdade. Quando é que voltaremos a ter uma candidatura viável, com a coragem de dizer os nomes daqueles que nos assaltam e condenam?

Ah, sim: na vigência do esquema criminoso, a Petrobras financiava boa parte da "consciência crítica" da "arte brasileira". Afinal, os desdentados, miseráveis e barrigudinhos produzidos por esse modelo merecem ao menos as metáforas pedestres –de esquerda, claro!– expelidas por "artistas" financiados. É de dar nojo.


FOLHA DE SP - 03/10


Se eleito, Aécio terá algumas prioridades inescapáveis. É imperativo desmontar a 'herança maldita' deixada por Lula e Dilma Rousseff


A ordem em que os três principais candidatos à Presidência da República têm aparecido nas pesquisas parece-me ser o inverso de suas capacidades e do que deles se pode esperar de positivo para o Brasil.

Dilma Rousseff chegou ao Planalto como atriz num dos muitos enredos maliciosos que Lula é capaz de conceber. Com seus próprios recursos ela dificilmente se elegeria vereadora em Porto Alegre ou em Belo Horizonte. Lula "vendeu-a" como uma exímia conhecedora da máquina pública e a grande gestora de projetos que daria continuidade às "grandes conquistas" de seu próprio governo.

Tendo já cumprido um segundo mandato, Lula não iria se desgastar numa luta interna, muito menos emprestar sua popularidade a um candidato político. Queria um candidato que lhe devotasse uma fidelidade canina, o melhor "poste" que pudesse encontrar.

Na campanha e nos debates, ela quase nada precisaria falar; dos votos encarregar-se-iam Lula e os marqueteiros. Foi assim que o Brasil viveu um dos maiores paradoxos eleitorais de que se tem notícia. Nas democracias, candidatos sabem que suas chances de sucesso dependem de se tornarem conhecidos do maior número possível de eleitores. Com Dilma, deu-se o oposto: seu sucesso deveu-se à quase total clandestinidade em que ela se manteve.

Sob muitos aspectos, Marina Silva é o oposto de Dilma. Não creio que ela se prestasse a uma farsa eleitoral. Suas ideias parecem-me se constituir, parte por elaboração própria, parte por uma saudável utilização dos órgãos auriculares.

Apesar dessas qualidades, tinha certeza que o status de favorita que ela chegou a atingir não se sustentaria. Resultara de uma situação extraordinária que se diluiria. O desaparecimento de Eduardo Campos e a comoção dele decorrente catapultaram-na para a segunda posição.

O súbito aumento do apoio a Marina deveu-se à simpatia com que ela passou a ser vista por eleitores que, de outra forma, não a veriam como opção; à reativação e a uma tentativa de canalização mais positiva do manancial de votos contra Dilma e Serra que ela mobilizara em 2010; e à sensação de que ela passara a encarnar uma concepção idealizada de política com possibilidade real de chegar ao Planalto.

Ao envolvê-la numa aura de vencedora, os elementos mencionados proporcionaram-lhe a indispensável interlocução com grupos sociais que até a morte de Campos a viam como problema. Facilitaram a substituição da acanhada plataforma de 2010 por uma mais ampla e realista, respaldada por economistas competentes.

As últimas pesquisas mostram Aécio Neves na terceira posição. Admitindo que as intenções de voto em Dilma e as de votar em branco ou nulo estão mais ou menos consolidadas, Aécio precisa "tomar" de Marina só mais alguns pontos para ultrapassá-la. Difícil é; impossível, não. Se for ao segundo turno, terá o mesmo tempo de TV que Dilma e será visto como uma alternativa real ao oficialismo petista.

Na segunda (29), os agentes econômicos reagiram à melhora de Dilma nas pesquisas avisando que a reeleição será um desastre. As ações da Petrobras despencaram 10%. Corteses como são, Lula e Dilma deveriam pedir desculpas à analista do Santander cuja demissão exigiram por ter tido a "ousadia" de fazer uma previsão nessa mesma linha.

Se eleito, Aécio Neves terá prioridades inescapáveis. Em termos gerais, é imperativo desmontar a "herança maldita" deixada por Lula e Dilma. Reverter o clima de desmoralização que tomou conta do país desde 2003, a aceitação passiva da incompetência e da falta de responsabilidade, a condução ideológica e amadorística da política econômica e a tibieza no combate à corrupção.

Urge restabelecer o império da lei, a validade dos contratos, o valor das instituições e a independência entre os Poderes. Na política externa, Lula e Dilma deram seguidas mostras de obtusidade, no melhor estilo terceiro-mundista. Mas foram além: praticaram ativamente uma opção preferencial por regimes populistas e ditaduras, sabe Deus se como fruto de alguma convicção ou só no juvenil afã de marcar posições antiamericanas.

Dilma e a Polícia Federal - EDITORIAL O ESTADÃO



O ESTADO DE S.PAULO - 03/10


Para tentar impedir que o escândalo do mensalão e as denúncias de corrupção contra o governo respinguem sobre sua campanha pela reeleição, a presidente Dilma Rousseff vem alegando que concedeu à Polícia Federal (PF) total liberdade para investigar as denúncias de corrupção na Petrobrás, inclusive orientando-a a instaurar inquéritos criminais e a adotar medidas para acabar com o uso de caixa 2 pelos partidos políticos e esquemas de lavagem de dinheiro para financiar campanhas eleitorais.

O argumento foi usado por ela em um dos últimos debates entre os presidenciáveis. "Eu dei autonomia à PF para prender o senhor Paulo Roberto e os doleiros todos", afirmou na ocasião. O mesmo argumento também foi repetido nos programas do PT durante o horário eleitoral, que deram a entender ter sido Dilma a primeira inquilina do Palácio do Planalto a ter colocado a PF a serviço do combate à corrupção e dos ilícitos cometidos em empresas estatais.

A propaganda do PT é enganosa e a fala de Dilma carece de consistência técnico-jurídica, deixando claro o quanto ela desconhece a Constituição que há quatro anos jurou cumprir. Em palestra para cerca de 200 estudantes e professores de direito de uma universidade de Brasília, quando discorreu por mais de uma hora sobre reforma política, financiamento de campanha eleitoral, compra de votos, corrupção e fortalecimento do regime democrático, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa enfatizou esse ponto.

"Não é a presidente da República que manda prender. Ela tem, no máximo, poderes para não interferir na atuação do órgão", disse Joaquim Barbosa, confessando-se "surpreso" com o desconhecimento generalizado de direito constitucional por parte dos políticos - inclusive Dilma.

Essa foi uma crítica sutil às afirmações não só da presidente da República, mas também a recentes declarações do vice-presidente, Michel Temer, e do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Eles haviam protestado contra a vistoria, por agentes da PF, de um avião da campanha do senador Edison Lobão Filho, candidato ao governo do Maranhão e filho do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, acusando a corporação de ter sido "instrumentalizada para atingir candidaturas legitimamente constituídas".

Na ocasião, Dilma - que hoje elogia as ações da PF - criticou a corporação. "Qualquer órgão integrado por pessoas pode cometer um erro. Mas autonomia não significa autonomia para cometer coisas incorretas. Uma das coisas que a gente tem que garantir, principalmente em processos eleitorais, é que órgãos governamentais não sejam usados em proveito de um ou outro candidato", afirmou Dilma, com sua maneira tortuosa de se expressar, e de certo modo endossando a tese de que a ação de busca e apreensão executada pela PF teria tido o objetivo de "constranger" e "intimidar" políticos peemedebistas maranhenses.

Na realidade, como afirma o ex-ministro Joaquim Barbosa, a Polícia Federal é um órgão de Estado e não precisa de qualquer autorização presidencial para exercer suas atribuições funcionais. Pela Constituição, ela tem competência para promover investigações independentes, mesmo quando os investigados sejam políticos da base do governo ou mesmo integrantes da administração direta e indireta. Em outras palavras, a autonomia da Polícia Federal não é administrativa nem financeira. É uma autonomia funcional. E se seus delegados e agentes deixarem de agir, em casos de denúncias de algum ilícito, incorrem em crime de responsabilidade.

Por isso, quando a presidente da República alegou no debate entre os presidenciáveis que estimulou a PF a investigar as denúncias de corrupção na Petrobrás, "o que não acontecia nos governos anteriores", ela contrariou a verdade.

Seu comitê eleitoral ainda tentou refutar as críticas de Barbosa, distribuindo uma nota em que alega que as palavras de Dilma acerca dos "atos de atuação legal da PF" estariam sofrendo "interpretações maliciosas e inverídicas". Maliciosa é, mais uma vez, a insistência da assessoria de Dilma em desmentir as bobagens que ela fala.

Aparelhamento sem pudor - EDITORIAL O ESTADÃO




O ESTADO DE S.PAULO - 03/10

Os Correios já foram uma das estatais mais admiradas, pela qualidade e capilaridade dos seus serviços. Era um símbolo inequívoco da unidade do País, aproximando a sua população, do Oiapoque ao Chuí. Mas o aparelhamento promovido pelo PT na última década desfez esse símbolo e a cada dia reescreve a história da estatal, transformando-a num mero cabo eleitoral. O episódio mais recente dessa triste história é um vídeo obtido com exclusividade pelo Estado, no qual o deputado estadual mineiro Durval Ângelo (PT) expressa satisfação e orgulho pelos bons serviços prestados pelos Correios à campanha petista em Minas Gerais, pelo apoio tanto à candidata à reeleição Dilma Rousseff como ao candidato a governador Fernando Pimentel.

O conhecido aparelhamento da administração pública promovido pelo PT recebeu nova prova - histórica -, agora em vídeo. Uma prova que não pode ser negada nem contestada. O vídeo em questão é similar aos vídeos - infelizmente, bastante conhecidos dos brasileiros - que flagram um corrupto recebendo, por exemplo, uma mala de dinheiro. No caso dos Correios, é a prova incontestável do uso de uma empresa estatal - que deveria servir ao público - em benefício de um partido.

Na reunião gravada, tudo é dito abertamente, sem qualquer escrúpulo, sem qualquer pudor. Diz o deputado petista: "Se hoje nós temos a capilaridade da campanha do (Fernando) Pimentel e da Dilma em toda Minas Gerais, isso é graças a essa equipe dos Correios".

Para que não pairasse dúvida do grau de importância da reunião, o próprio presidente dos Correios, Wagner Pinheiro, está lá presente, como testemunha do aparelhamento. Da mesma forma que um presidente de uma empresa privada ouve dos seus gerentes os bons resultados operacionais da empresa, Wagner Pinheiro ouve de Durval Ângelo os bons resultados da ação dos Correios em prol das campanhas de Dilma e de Fernando Pimentel no Estado de Minas Gerais. "Se hoje nós estamos com 40% em Minas Gerais, tem dedo forte dos petistas dos Correios", diz Durval, acintosamente.

Diante da revelação feita pelo Estado, o presidente dos Correios emitiu uma nota na qual afirma que "os Correios não estão contribuindo com a campanha de qualquer candidato". Justifica-se dizendo que "a reunião não ocorreu durante o expediente e a empresa não custeou despesas relacionadas a ela". É como dizer que um deputado não recebeu propina como deputado porque não era no seu horário de trabalho.

No vídeo, o deputado pede a Pinheiro que faça a direção nacional do PT saber dos bons serviços prestados pela estatal. "Queremos que você leve à direção nacional do PT, que eu também faço parte do diretório, mas também à direção nacional da campanha da Dilma a grande contribuição que os Correios estão fazendo". O vídeo explicita assim não apenas o aparelhamento, mas como é feita a coordenação do aparelhamento e como o PT não brinca no poder. Instala-se e cobra resultados - e os camaradas têm grande zelo em mostrar os resultados obtidos. Que não fique nas sombras o empenho deles no aparelhamento.

Durval não podia ser mais explícito: "No dia da reunião que tivemos no hotel (da qual participou Pimentel), o Helvécio Magalhães (coordenador da campanha do petista) falou: vou me reunir com a equipe ainda esta semana e liberar a infraestrutura. E se hoje nós temos a capilaridade da campanha do Pimentel e da Dilma em toda Minas Gerais, isso é graças a essa equipe dos Correios". Diante da repercussão do caso, Durval explicou que "liberar a infraestrutura" era uma referência a funcionários petistas dos Correios que pediam férias para fazer campanha. O vídeo mostra o contrário: o uso da máquina pública, e não do tempo livre privado, para fazer campanha.

O que se vê no vídeo é uma espécie de sentimento do dever cumprido. Mas o parlamentar petista alerta: aquilo ainda não era uma prestação de contas completa. Esta virá após a eleição de Dilma e Pimentel, na qual - pelas suas palavras - a estatal está fortemente empenhada. É o aparelhamento sem pudor e sem escrúpulos.

Aparelhos atuam nas eleições e na corrupção - EDITORIAL O GLOBO



O GLOBO - 03/10
Usam-se fundos de pensão de estatais em altas negociatas, mas não se ouvem reclamações das vítimas, talvez por uma estranha solidariedade ideológica


Prestes a completar 12 anos de Planalto, o PT, ou facções dele, vê-se envolvido em alguns casos emblemáticos de uma característica relevante desse longo período no poder, a montagem de aparelhos do partido na máquina pública.

A invejável disciplina e empenho petistas na defesa da visão de mundo do partido se reflete no exercício do perigoso princípio de que “os fins justificam os meios”. Com este pano de fundo é que foi engendrado o mensalão, abastecido com dinheiro público desviado sem pudores para comprar apoio político-parlamentar ao primeiro governo Lula.

Os últimos meses têm sido férteis em casos nada abonadores derivados da atuação de aparelhos petistas. O que operou desde o primeiro governo Lula na Petrobras, num conluio entre sindicalistas, políticos e empreiteiros, apenas começa a ser conhecido com vazamentos de partes de longos depoimentos prestados sob acordo de delação premiada pelo ex-diretor da empresa Paulo Roberto Costa.

O doleiro desse e outros esquemas, Alberto Youssef, fez o mesmo acordo com a Justiça e deve contribuir com informações também esclarecedoras deste que talvez seja o maior escândalo, em cifras, dos últimos tempos.

Soube-se há pouco da atuação enviesada dos Correios, em Minas, para privilegiar as candidaturas de Dilma e de Fernando Pimentel, esta ao governo do estado, na distribuição de peças de propaganda eleitoral.

Desvendada pelo jornal “O Estado de S.Paulo”, a história também é exemplar da atuação de aparelhos petistas, cujo resultado é a “privatização” dessas estatais por interesses partidários. E como a eleição presidencial tem sido a mais dura enfrentada pelo PT desde a vitória de Lula em 2002, todo este aparato de militantes instalados dentro da máquina do Estado — funcionários concursados ou não — trabalha nestes dias com empenho extra. Há muita coisa em jogo nas urnas — além do poder em si, empregos e dinheiro.

Na mesma linha dos golpes dados na Petrobras, há o uso criminoso de fundos de pensão de funcionários de empresas públicas, em altas negociatas, diante do silêncio do braço sindical petista e, por tabela, dos funcionários.

O próprio Youssef e o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, são citados em investigações sobre malfeitos com dinheiro da Petros, fundo dos empregados da Petrobras, e Postalis, não por acaso o fundo dos Correios. Há várias operações de que resultam prejuízos para os fundos e, claro, lucros para os operadores.

Pouco ou nada se sabe de reclamações contra esses virtuais assaltos aos fundos. Talvez o silêncio se explique por alguma estranha solidariedade ideológica. Na Petrobras, há quem não critique a gestão no mínimo temerária de José Sérgio Gabrielli, em cuja administração Paulo Roberto fez a festa, por considerá-lo um “nacionalista”. Mais uma vez, fins justificam meios.

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